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Aspectos da vida e da obra de Rui Facó [2]
Este texto de Moisés Vinhas é a primeira biografia de Rui Facó, escrito após a morte e em homenagem a Rui

Facó discute certos problemas da nossa História; conceitos que esposava, como as relações da Igreja com o Estado, sobre a revolução de 1930, sobre o papel da imprensa, até então não abordados com essa objetividade. Ao tratar desses assuntos, e dos demais, encara os fatos em processo de desenvolvimento. Nos seus escritos sente-se uma segurança e mesmo fé no futuro do País. Este transbordar de confiança tem seu alicerce na sua fé e nas forças do povo brasileiro, a quem defendeu dos insultos, denegrimentos dos opressores estrangeiros, seus agentes nacionais e dos céticos. Outro fator que influenciou esta sua segurança foi sua vivência, o conhecimento da trajetória dos destinos da humanidade para uma sociedade sem classes, a sociedade em que reina o verdadeiro humanismo e a cultura no mais alto sentido.

Facó, além disto, é original no abordar dos assuntos, assim como ao tratar da formação do povo, através do diálogo de Alviano e Brandônio, extraído do diálogo primeiro do antigo livro Diálogo das Grandezas do Brasil, de 1618, de Ambrósio Fernandes de Brandão. Ao contrário de vários historiadores que condenam a mistura das raças que povoam este País, e que vêem um perigo de a raça negra sobrepujar os brancos, caindo assim no racismo, exalta esse fato como "uma das mais sábias soluções do colonizador europeu: solução imposta pela necessidade". Este amalgamento das raças, Facó liga as façanhas da conquista do interior pelos bandeirantes, e descobre nestes fatos a formação do espírito nacional, da consciência e da força do povo, com sua originalidade, sua língua própria enriquecida de termos africanos e tupiguaranis, sua cultura e suas lutas contra os holandeses e as idéias de sua libertação do jugo português, igualmente. Não desliga, mas, pelo contrário, funde esta formação do povo com seu espírito revoltado contra a opressão e a escravidão: amalgama, assim, o espírito rebelde contra a escravização dos índios que preferiram o extermínio à escravidão; às longas e tenazes lutas dos escravos negros por sua libertação, com as campanhas de Canudos, os cangaceiros, os Lampiões, os beatos, os movimentos republicanos e a libertação do imperialismo e do latifúndio: este constitui um fio único na formação do povo brasileiro, na sua maneira de ser e na perspectiva do futuro.

Facó, como já disse, não obstante denunciar as mazelas da escravidão e da dominação estrangeira que determinam a miséria e o atraso, considera "o povo organicamente otimista e alegre e que sabe externar o seu otimismo e alegria à medida que se asseguram melhores condições de existência, que vê o atraso superado e o progresso avançar, vencendo todos os enormes obstáculos que lhe têm sido opostos durante séculos".

Extremamente irmanado com o povo, estigmatiza os aspectos do racismo em relação aos negros e demonstra como em determinados setores da vida econômica, cultural e administrativa aparece a discriminação. Revela como elementos da influência dos setores racistas da América do Norte penetram em nosso País e como entram em choque com a formação e a tradição do povo.

[...] Uma preocupação que se faz sentir em todos os seus escritos é a de encontrar, elucidar e discernir as particularidades da realidade histórica nacional. Para isto ele contribuiu sob duas formas: ao desenvolver e aprofundar idéias timidamente enunciadas por outros homens de letras, e ao apresentar idéias novas, próprias.

Mostra, com razão, que a atual estrutura econômica agrária semifeudal, com o acentuado monopólio da terra, procede desde o tempo da descoberta do Brasil e da transplantação da estrutura e das relações feudais pelos colonizadores da sua terra de origem, e de como no processo de desenvolvimento seus alicerces foram abalados e chegamos às atuais relações semifeudais. O mesmo processo deu-se com o monopólio da terra - o latifúndio. Este, afirma, mantém-se até hoje.

[...] Ridicularizou os falseadores da história do nosso povo, que atribuem os grandes fatos a acasos ou gestos tresloucados de "Independência ou morte", negando propositadamente o papel decisivo das massas na História do desenvolvimento da nação, até o presente.

[...] Demonstra que tudo constitui um processo de luta de classes, no qual as classes dominantes procuram manter seus privilégios e contornam as situações perigosas para elas. Mas, de outro lado, a História do Brasil é parte integrante da História da humanidade que objetivamente é subordinada ao processo das relações de produção, às transformações quantitativas e qualitativas, ao processo irreversível no sentido do socialismo. Assim não puderam impedir o surgimento da burguesia como força revolucionária; do proletariado como classe conseqüente; da pequena burguesia urbana e da influência do socialismo; conseqüentemente não puderam impedir a eclosão dos movimentos revolucionários de 1922, 1924, 1930 e 1935, nem tolher a organização política do proletariado.


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